Vida de imigrante

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Eu sou bisneta de imigrantes. Espanhóis e italianos, como muitos brasileiros da minha geração.

Em 2010, eu me tornei uma. Por outra motivação, ainda bem. Meus bisavós fugiram da guerra, da fome, por sobrevivência. Eu fugi da comodidade, por curiosidade. Que sorte!

Foram quase quatro anos fora do Brasil. Os mais intensos e gostosos da minha vida, sem dúvida. Desde então, não deixei de imigrar. A volta pro Brasil, que durou quase dois anos, não foi diferente. Estranho me sentir imigrante no país onde nasci, mas a verdade é que foi assim. Porque o Brasil mudou, São Paulo mudou, a Vila Zelina mudou; tudo porque eu mudei também, e não foi só de endereço.

Não consigo comparar nenhuma outra experiência com o gelo na barriga de subir num avião e não saber o que vou encontrar na hora que sair. Porque, por mais que eu tenha me preparado, a verdade é que o destino do imigrante é desconhecido.

Chorei nas duas vezes que deixei meu Brasil pra trás e chorei ainda mais quando voltei. Não foi de tristeza nem de medo; foi de emoção e de esperança. Esperança de ser mais feliz, de ser uma pessoa melhor, de que vai dar certo. Pra mim, essa é a graça da vida de imigrante. É isso me faz ir, ficar e voltar. Foi isso que me fez imigrar.

Já passou um ano desde que vivi isso outra vez. Já estou há um ano no México, tão parecido com o Brasil na contradição e na desigualdade. Já tenho meu supermercado, minha cerveja e taqueria preferidos, já me acostumei à burocracia personalizada, encontro as mesmas pessoas no metrô todos os dias, reclamo da cidade como se fosse minha, já não pergunto se a comida é picante, reconheço os barulhos do nosso apartamento, sinto saudade… muita, de muita gente, da pizza, do requeijão, do pastel, do café, de falar Português.

Mas não deixei de esperar.

Não de esperar sentada. Esse outro esperar que faz o coração bater mais forte e dá um nó na garganta. Esse esperar de esperança, de saber que tem muita vida pela frente e de que ela vai ser melhor do que já foi.

¡Gracias, México!

Obrigada, mundo!

Quando a amiga casa

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Já houve outros casamentos. Já estive com elas em outras festas. Já curtimos viagens juntas. Do JUCA à Europa ou ainda um pulinho ali na Rivi ou no amado Rio. Já nos reunimos para beber e comer incontáveis vezes. Já dançamos juntas. Cantamos juntas. Choramos juntas. Abraçamos. E rimos. Ah, como rimos. Nosso passatempo preferido. Fazemos porque gostamos.

Já tivemos nossos momentos de tensão. Alguns momentos que abalaram alguns laços. E muitos outros que vieram para reforçá-los. Como este fim de semana que acabamos de viver. O primeiro casamento de uma das integrantes da Patota. Nossa primeira noiva. Nossa primeira viagem com as sete juntas (e quase todos os respectivos). Nossa primeira vez com duas madrinhas na turma. O primeiro buquê jogado. E pegado. Nossa primeira vez a dizer: uma de nós está casada.

Arrisco a dizer que pela primeira vez nos vimos tão adultas. Casamento é coisa séria. Ao mesmo tempo, poucas vezes vi a turma tão brincalhona como crianças em parque de diversão. Como se cada uma de nós estivesse realizando um sonho também. No fundo, acho que estávamos mesmo. Porque a felicidade de uma é sentida pelas outras. Nós estivemos presentes em cada etapa para a realização do casamento – umas mais, outras menos, mas sempre ali representadas. Estávamos presentes também na barra da saia. Ainda bem!

Quem casou foi a Li. Com o Helder. Em Ribeirão Preto. Numa igreja que é uma graça. Numa cerimônia bonita. Com direito a uma festa que foi a cara da noiva. Com homenagem feita pelo melhor amigo do noivo. Com convidados que querem muito bem o casal. Numa noite de chuva. Dizem que dá sorte. E também estava frio. Como a Li queria.

Quando a amiga casa e ela faz parte do nosso grupo de amigas “da-faculdade-do-coração-pro-resto-da-vida”, a gente fica meio sentimental mesmo. A gente agradece a oportunidade de estar presente neste momento tão especial da vida dela. A gente só quer desejar ao casal toda felicidade do mundo – porque amor eles já tem! A gente já começa a pensar nos próximos, porque a gente quer que todas tenham a felicidade de viver um amor tão bonito quanto ela tem vivido nos últimos dez anos – e que tenha a oportunidade de celebrá-lo. A gente torce para ter a sorte de também encontrar alguém com quem compartilhar o resto da vida.

Quando a amiga casa, a gente para pra pensar na vida e se dá conta de que a amizade se transforma ao longo dos anos. Algumas prioridades mudam e em algum momento uma ou outra estará mais distante, ainda que não tenhamos mais oceanos nos separando. Vai ter hora que a gente vai errar a mão, se ausentando demais ou exigindo demais uma das outras. Vai acontecer de a gente se decepcionar, como já aconteceu, tenho certeza. Mas aí a vida cuida de trazer a gente de volta por que é nosso.

Um colo amigo. Uma risada gostosa. Abraços apertados. Dilemas. O choro é livre e frequente. Comemorações. Companheirismo. A gente dança conforme a música que a vida nos impõe. Juntas, a gente faz cada passo valer a pena.

Ao casal, toda felicidade do mundo! <3

Ao casal, toda felicidade do mundo! <3

Por Carrô.

A minha mãe

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A minha mãe é uma peça rara.

Quando a criançada do prédio organizava a festinha do Dia das Bruxas (ninguém falava em Halloween, não!), todo mundo se fantasiava e passava pelos apartamentos pedindo doces. Eu, vaidosa que era, não gostava de ficar “feia”. Bruxa, monstro, zumbi…aquilo não era para mim. Por isso, ela inventou um personagem perfeito para aquele dia: a mulher de branco. Me vestiu com tule, cetim e pendurou umas lantejoulas douradas. Meio fantasma, meio umbandista, definitivamente, eu era a mais original.

Quando eu era adolescente, com a cara toda inflamada e esburacada de espinha, demorava horas para me arrumar e juntar coragem para sair do meu quarto e enfrentar o mundo. Ela me esperava, e, quando me via toda rebocada de corretivo, ainda conseguia dizer que eu estava linda.

Já “adulta”, nas tão esperadas festas à fantasia da faculdade, eu fui borboleta, indiana, sereia… eram maratonas cansativas e divertidas na 25 de março pescando acessórios e tecido para montar as melhores fantasias. Cansei de dizer a muita gente que tudo era “assinado” por mamãe.

Quando eu acordava às 5h30 para ir trabalhar lá bem longe, ela já estava preparando meu leite com nescau. Eu saía do banho e escutava a colher batendo forte no copo. Tec, tec, tec, tec. Nada soa tão carinhoso como esse barulho tão particular. Às vezes sem trocar uma palavra, ela me acompanhava andando até o ponto de ônibus, e dava tchauzinho quando eu já estava dentro dele.

Quando eu decidi que queria mudar de vida, de país, ela foi a primeira a saber e a me apoiar. Me ajudou a meter toda a roupa que eu podia em sacos de plástico a vácuo e cada ano me manda uma surpresa que só ela poderia mandar. Tem roupa que até hoje tem o cheirinho do amaciante que ela usa.

Quando disse que estava apaixonada e, dois anos depois, dei a dica de que ia dar um grande passo com este amor, ela disse que já imaginava.

Algumas vezes a flagrei falando bem de mim para desconhecidos ou pessoas muito próximas, quando me faltavam motivos para acreditar que havia algo de bom para ser dito.

Eu adoro quando dizem que a gente se parece, quando nos confundem por telefone. Porque ela é assim.

Ela é dessas peças raras que acreditam, confiam e apoiam. Ela é dessas que amam incondicionalmente.
Mulher de branco, sereia, indiana, borboleta… eu sou sempre sua filha e fã.

Eu amo a minha mãe. Feliz aniversário para ela!

E de trilha sonora, nada de “Parabéns a você”. Eu acho que a Elis, que também é Regina, tem mais a cara dela. Porque a cada ano, ela rejuvenesce!

Um é pouco, dois é bom, três é…

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Num dia muito parecido a esse, eu cheguei.

Num dia muito parecido a esse, eu cheguei.

É demais mesmo. Nunca achei que fosse ser tão demais. Em 3 anos sinto que vivi o que viveria em 10, 20, sei lá quantos, se não tivesse nunca mandado minha carta de apresentação pra um tal de máster de psicocriatividade em Barcelona.

Hoje completo 3 anos morando aqui e muita água rolou. Chuva e lágrimas a toneladas, mas, inevitavelmente, Barcelona sempre me presenteia com um – e até dois – arco-íris depois de uma boa tempestade.

Me surpreendi e me decepcionei; comigo e com os outros. Mas quem nunca falhou foi ela, essa cidade linda, que me ensinou o peso da independência e a delícia da liberdade.

Um sol de rachar, uma umidade de esponjar qualquer cabelo, um frio que faz doer os ossos de quem carrega um coração tropical como o meu. Mas… ah… Barcelona é muito boa comigo.

Eu, que sempre fui mulher de malandro, passei a ser sua amante. E me rendi a Barcelona, à sua melancolia, às suas sacadas modernistas, às suas curvas, aos pátios interiores que cada prédio tem, ao seu mistério gótico, ao seu romantismo de donzela medieval, à natureza, aos cantinhos silenciosos, à sua história milenar, às paredes castigadas por uma guerra muito recente, aos bares agitados e barulhentos, às suas cores de verão… à vida de bairro dentro de uma metrópole.

Ela é muitas, e me permite ser quem eu sou. E não há nada mais libertador que isso. Ninguém disse que ia ser fácil, mas eu não tinha idéia de que seria tão bom.

Que meu novo ano que começa agora aqui valha por 10, 20, 30… mas que sempre valha.

Salut i força al canut!

Por Má-Má.